Pessoal, voltei! Para celebrar o retorno, aí vai mais um miniconto!
Minicontos do desconforto -- 19
Na entrada da roda-gigante, a moça perguntou: cabine balouçante ou não? Ele escolheu a primeira opção, parecia mais emocionante. Quando a trajetória da roda chegava perto do ápice, a cabine deslizava por barras de ferro estrategicamente dispostas dentro da estrutura, balançando às vezes suavemente, às vezes com violência.
Olhando a paisagem iluminada de cima, exposto ao vento primaveril e ao sol moribundo, recordou sua infância, em que costumava balançar-se sozinho na cama, cantarolando para pegar no sono. Eram momentos em que perdia contato com o mundo externo e se encontrava de bom grado com sua alma, embora não pudesse enxergá-la nem entender seu sorriso complacente.
Aconteceu a mesma coisa ali: não mais que de repente as luzes do parque sumiram e foram substituídas pelo reflexo da lua minguante no lago artificial, acompanhada de uma bela entourage de estrelas que piscavam para ele, desinibidas. Deixou-se levar e a paisagem mudou de novo. Sua alma, bem mais velha do que ele, surgiu num galeão voador e estendeu-lhe a mão. Como recusar o pedido da capitã que o comandara nas piores borrascas da existência?
Tomou-lhe a mão.
-- Não havia um homem nesta cabine? -- perguntou a moça à colega quando a roda parou.
Àquela altura ele já estava no aclive inicial de uma nova montanha-russa, num parque diferente, num mundo diferente. E sua alma era jovem de novo.
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