31.1.03

Vou tomar uma cerveja hoje com meu grande amigo Octavius Britus, um sábio em muitas áreas. Há milênios não nos vemos, devido aos desencontros de trabalhos e viagens. Espero que ele tome vergonha e algum dia mande alguns de seus poemas para eu publicar no Cadafalso I.
"Of what a strange nature is knowledge! It clings to the mind, when it has once seized on it, like a lichen on the rock. I wished sometimes to shake off all thought and feeling; but I learned that there was but one means to overcome the sensation of pain, and that was death--a state which I feared yet did not understand."

(Mary Shelley, "Frankenstein")

30.1.03

Ou melhor: Senhor, dai-me uma guitarra. Aí as coisas vão melhorar ;-)
Vou confessar uma coisa: estou doido para este mês de janeiro acabar e ver se fevereiro traz fluidos mais simpáticos. O mês foi um horror para mim em todos os sentidos. Estou precisando espairecer, com urgência. A família de Wal toda está lá em casa (minha segunda sobrinha está para nascer, e como o pessoal mora longe, precisa fazer um pit-stop por lá), Wal anda uma pilha de nervos e acaba sobrando para mim (logo eu, que não gosto de levar desaforo para lugar nenhum...). Já deu para sentir o clima, né? E não posso nem falar nada, porque, se não fossem minha sogra e minha cunhada, eu ia ficar sem grana mesmo este mês.
Mas que dá um desânimo, lá isso dá. Meu consolo é ir trabalhar. Mas desde quando trabalho é calmante? Senhor, dai-me paciência e equilíbrio.

29.1.03

Tive uma experiência com o Multishow semelhante à que o Gustones teve tempos atrás. Resolvi gravar o show "Kiss: The Last Kiss", que a banda deu em Nova Jersey em 27 de junho de 2000, na última segunda-feira. Mal começou o programa -- tocou só uma música, "Detroit Rock City" -- e entrou um aviso "Interrompemos este programa para exibir o Big Brother Brasil. Dentro de vinte minutos voltaremos à programação normal". Fui tomado por um acesso de fúria e por pouco não joguei tudo no quintal de casa: televisão, set-top box da Net, o escambau. Felizmente estava assistindo enquanto gravava e dei um pause bem na hora. E felizmente, de novo, depois do BBB (que não vi, é óbvio. Troquei de canal na hora) o show recomeçou do exato ponto em que havia parado e foi até o fim. Agora, vem cá, se eles têm que exibir os vinte minutos desta porcaria de reality (realidade? onde?) show, porque não iniciam os programas do horário um pouquinho mais tarde e avisam seus telespectadores? Mas não, têm que interromper a qualquer minuto a programação, como se aquela merda do BBB fosse alguma notícia importante de última hora, e nos deixar à mercê do brilhantismo intelectual dos participantes.
D'après Patricia Kogut, aqui vai minha nota: zero mil zerocentos e zerenta e zero.

* * *

E a Warner ontem, que exibiu seus episódios de "Friends" sem legendas? Tá bom que a gente já tem um monte de palavras em inglês embutidas na língua, mas isso é ridículo. Esses canais não têm o mínimo respeito pelo assinante. E isso tudo sem falar dos anúncios sobre "novas temporadas" em meio a episódios repetidos à exaustão. No Sony é a mesma coisa. Nota zero absoluto Kelvin.

27.1.03

Minicontos do desconforto -- 45

-- O próximo -- disse o velho no portão.
Ele levantou-se e tocou um blues lento.
-- Só isso? -- perguntou o velho.
Ele apontou para cima. O velho olhou.
Todos os os anjos haviam parado de cantar e tocar suas liras e estavam ouvindo. Todos choravam (por isso choveu tanto no Mississippi aquela semana).
Então Pedro deixou o guitarman entrar. E Deus deu-lhe uma garrafa de uísque, para que não perdesse a tristeza entre as nuvens.

25.1.03

Da ótima, ótima, ótima coluna de Arnaldo Bloch sobre TPM:

"— Raiva, tristeza, melancolia, desejo de morrer e vontade de quebrar tudo? Bom, eu sou homem e sinto isso toda semana."

Cara, podes crer.

24.1.03

"Permite-me que um instante repouse na calma das Idéias, concentre cultualmente o Espírito, como no recolhido silêncio das igrejas góticas, e deixe lá fora, no rumor do mundo, o tropel infernal dos homens ferozmente rugindo e bramando sob a cerrada metralha acesa das formidandas paixões sangrentas."

(Cruz e Souza, "Oração ao Sol")

23.1.03

Minicontos do desconforto -- 44

Brigaram. Ele jogou um dos pratos favoritos dela, com a imagem da Igreja do Senhor do Bonfim, na pia com violência, e o pobre partiu-se. Ela, sempre calma, mas com talentos vulcânicos, cerrou os dentes, foi até o armário, pegou a louça que a madrinha dele lhes dera no casamento e a atirou, peça a peça, a seus pés.
Naquele momento tocou "Eine kleine nachtmusik" na casa ao lado.
Os dois levaram um pequeno susto.
Depois, do nada, riram.
E improvisaram uma dança desajeitada sobre os cacos.

22.1.03

Stevie Ray Vaughan morreu num estúpido acidente de helicóptero em agosto de 1990, após um show junto com Eric Clapton e Buddy Guy. Tinha 35 anos. Mas seu legado na guitarra é eterno. Peguei um DVD com duas apresentações suas no programa "Austin City Limits", uma em 83, no começo do sucesso, e outra em 89, no auge. Nas duas, o homem estava soberbo. Mesmo nervoso na primeira, ele arrasou em "Pride and Joy" e "Voodoo Chile", de Hendrix, uma música que poucos guitarristas conseguem executar direito até hoje. Na segunda, mais relax, com a adição do excelente tecladista Reese Wyman à sua Double Trouble, Vaughan arrasa ainda mais em sons como "Don't bother knocking", "Cold shot" e "Crossfire".
Eu me confesso um viciado em solos de guitarra, ainda mais se tiverem embutido o feitiço do blues. Gosto de rock pesado, mas não necessariamente do que meu antigo professor de música chamava de "pilotos de guitarra" -- aqueles caras que tocam um zilhão de notas por minuto, sem deixar o ouvinte saborear realmente a beleza do instrumento. Existem alguns muito bons, é verdade, como o Yngwie Malmsteen, por exemplo, mas para mim o bom guitarrista é aquele que sabe dar a nota certa na hora certa. Uma questão de feeling, e, claro, de dom também. Acho que na música pop mainstream de hoje os solos fazem muita falta.

17.1.03

“My nerves are bad to-night. Yes, bad.
Stay with me.
Speak to me.
Why do you never speak. Speak.
What are you thinking of?
What thinking? What?
I never know what you are thinking. Think.”

I think we are in rats’ alley
Where the dead men lost their bones.


(Thomas Stearns Eliot, "A game of chess")

16.1.03

A Crib Tanaka me mandou este filmezinho imperdível, que veio lá do Pulso Único. Assistam...

14.1.03

É duro ser crocodilo do outro lado do mundo. Vejam o que deu na CNN:

Crocodilo é preso em delegacia da Austrália. Motivo: vadiagem

4 de janeiro, 2003
Às 2:04 PM hora de Brasília (1604 GMT)

SYDNEY -- Um crocodilo foi preso por vadiagem e levado para a cela da delegacia da cidade de Derby, na região ocidental da Austrália, depois que as autoridades o capturaram quando perambulava no quintal de uma casa de repouso para idosos.
Segundo os policiais, o réptil, de 1,5 metro de comprimento, teria saído de um pântano da cidade e foi capturado na quinta-feira.
"Acho que ele chegou com a maré alta", disse o chefe policial Junior Djiagween. "E, provavelmente, descansava em algum lugar dos pântanos, quando a maré baixou e ele não tinha água para nadar". (...)

13.1.03

Minicontos do desconforto -- 43

Um amigo ligou para ele às 9:44 para dizer apenas: "Não suma, estou com saudade." Mesmo meio dormindo, sorriu. E percebeu que estava perdendo a batalha contra o conformismo. Naquela semana, telefonou para todo o seu catálogo de endereços -- mesmo para aqueles que não tinha muita vontade de ver por desentendimentos passados. Entendeu que a preguiça de ver as pessoas era o primeiro passo para o isolamento, onde era presa fácil para seus próprios demônios.

9.1.03

Comprei ontem e vi o DVD "Deep Purple -- Machine Head Live 1972", com um show na Dinamarca da banda em sua melhor fase: Ritchie Blackmore (guitarra), Jon Lord (teclados), Ian Paice (bateria), Ian Gillan (vocal) e Roger Glover (baixo). O show é pura eletricidade. Gillan arrebentando os pulmões em "Child in Time", Lord enlouquecendo e transformando partes de músicas em puro jazz com pitadas de clássicos, o igualmente louco Blackmore equilibrando a guitarra de ponta-cabeça nas mãos ou deitando-a ao chão para solar com os pés (e levando o público à loucura em "Lazy") e a máquina letal de bater em tambores que é Ian Paice no solo de "The Mule". O "Made in Japan", que seria gravado em agosto daquele ano, já estava todinho ali, com a exceção de "Smoke on the water". Fiquei estupefato vendo a performance dos caras. No fim, uma versão animadíssima de "Lucille", de Little Richard", e para fechar, "Black Night".
Também fiquei de comentar aqui o filme "The Last Waltz", em que a The Band se despediu das turnês em 76 no Winterland de San Francisco. Liderada pelo guitarrista Robbie Robertson, a banda arrasa junto com convidados como Ronnie Hawkins (cuja execuçào de "Who do you love?", permeada por gritos guturais, é hilária), Eric Clapton (com direito a duelos de guitarra com Robertson em "Further up the road"), Bob Dylan (com quem tocam "Forever young"), Van Morrison, The Staples e mais. Nos intervalos, depoimentos e histórias da banda. No fim, um Robertson com os olhos cheios d'água resume o motivo da despedida das turnês: "É apenas uma vida impossível".
Depois escrevo mais. Quero comentar sobre Stevie Ray Vaughan, um de meus guitarristas favoritos, e sobre um belo show da Sheryl Crow em Detroit.

8.1.03

Minicontos do (des)conforto -- 42

Gostava de observá-la dormindo, despudorada. Era quando revelava toda a inocência escondida na mulher forte e decidida. Isso também acontecia, em menor escala, quando ela estava distraída, fazendo qualquer coisa trivial -- fumando, lendo, escolhendo uma uva geladinha.
No dia seguinte, ganhou um dinheirinho inesperado no bicho. Chamou-a para a noite e gastaram tudo numa bela farra. Depois, no chope semanal com os amigos, ouviu de um deles:
-- Aí, cara, como é que você desperdiça tua sorte dessa maneira, gastando tudo no mesmo dia?
A resposta saiu de pronto.
-- Não foi desperdício. Minha sorte está em casa e eu investi nela.

6.1.03

Excelente a festa de aniversário do Gustones e da Elis, na Spin, sábado passado. Dançamos até nos acabarmos. Uma bela galera jornalística e a turma dos blogs se juntaram na bagunça geral. Nada como começar o ano com festas ;-))

3.1.03

Calendário

Naquele réveillon, o estudante jurou nunca mais se apaixonar. E a conheceu no dia seguinte, na praia.
No carnaval, a recém-apresentada que bocejara diante de seu papo-cabeça tascou-lhe um beijo no campo de futebol, longe do salão, no escuro.
Na semana santa, reviu a prima, que o arrastou para trás de uma árvore no fim da procissão.
Nas férias de julho... ah, com aquele frio...
Em sete de setembro ia dar certo, afinal o dia era da independência. Mas a irmã tinha uma amiga da Aeronáutica.
Por fim, no dia de finados pôs um buquê de cravinas sobre a lápide do seu juramento, que já fora comido pelos vermes.
E no réveillon seguinte jurou nunca mais jurar.

2.1.03

Olá! Voltei, pronto para outra, depois de um fim de ano calmo. Revi alguns velhos amigos, mas ainda falta encontrar outros. Descolei um DVD player e vi alguns shows memoráveis, que em breve comentarei aqui. O mais emocionante foi assistir novamente a "The Last Walz", despedida do The Band em 76 em San Francisco filmada pelo Martin Scorsese. Tinha visto o filme no cinema em 78 e ele me acompanha desde então na memória.