25.4.02

Minicontos do desconforto -- 15

Ao ver, muitos anos mais tarde, a espada na mão do carrasco, enquanto subia os degraus do cadafalso, ela lembrou-se de sua última fuga em terras escocesas, quando o mar lhe dera a opção de seguir para a Inglaterra ou a França. A primeira representava o desconhecido, a aventura, o perigo; a segunda, a segurança da família e de seus seguidores. Embarcou ainda incerta, mas atraída pela incógnita inglesa; no meio da travessia fraquejou e pediu que o barqueiro a levasse para a costa francesa. Foi então que soprou um vento suave que empurrou, com mãos frias mas gentis, o barco para a Inglaterra.

Resignou-se e saltou, com toda a sua altura e beleza, numa humilde vila de pescadores. Aliviada por ter deixado a Escócia e suas intrigas, não percebeu quando o jovem barqueiro, vestindo uma túnica, se despediu. Um dos lordes que a acompanhavam, porém, agradeceu ao rapaz e deu-lhe algumas moedas de ouro, dizendo:

-- Mestre Caronte, ser-lhe-emos eternamente gratos.

O barqueiro apenas sorriu e fez-se ao mar, logo sumindo na manhã nevoenta.

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