Minicontos do desconforto -- 38
A frente fria daquela semana completou à perfeição a sensação de tédio que o perseguira durante todo o mês. Estava com uma vontade doida de conhecer alguém tinindo de novo, de se apaixonar, de através de uma cumplicidade fresquinha ser capaz de olhar o mundo de ângulos inusitados. Foi quando deu de cara com ela numa fila de banco. O mais improvável dos lugares, é verdade. Mas não é que ela cravou os olhos nele também?
Aí seu peito deu o aviso. A carne tremeu, ele pôde sentir os ecos de uma britadeira enferrujada lá dentro. Era o coração que espanava os ácaros. Só que a diferença entre as velhas batidas compassadas de um dia-a-dia cinza e as novinhas, turbinadas, potentes, movidas a paixão, foi demais para ele. Teve um enfarte ali mesmo, no meio dos caixas eletrônicos e do mau humor dos clientes mal atendidos.
Sobreviveu. Mas, tão logo a família e os parentes foram embora do quarto do hospital, chorou amargamente ao crepúsculo, pois sabia que não teria mais coragem de amar.
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