16.1.05

Minicontos do desconforto -- 76
(para Elis)

Ela desconfiou quando ele começou a se vestir melhor, a botar um perfuminho antes de sair: já fora ferida além da conta para suportar mais uma traição. Sua mente começou a rodar spywares tentadores e, numa quarta-feira em que ele avisou que chegaria mais tarde, não resistiu e seguiu-o.

Viu-o sair do trabalho e entrar num táxi. Entrou noutro e mandou não perder o da frente de vista, como nos filmes.

O táxi dele parou num bar na Lapa. Ele saltou e entrou. Ela fez o mesmo, abrindo a porta do bar a tempo de vê-lo subir para o segundo andar, envolto em sombras. "Cachorro", pensou.

Subiu a escada já despida da preocupação de que ele a visse. Os saltos bateram forte nos degraus; ele ia ver só, ela ia fazer um escândalo.

Foi quando ficou momentaneamente cega pelo acender de luzes fortíssimas.

-- Feliz aniversááááario!!!! -- gritou a multidão, já no embalo de uma de suas músicas preferidas da trilha de um filme romântico.

Ele, rindo muito, estava com um buquê de rosas vermelhas na mão. Devagar, abraçou-a, beijou-a na orelha e sussurrou:

-- Você precisa ter mais fé, dear.

Ela ficou tão sem graça que no dia seguinte comprou-lhe um terno novo e um perfume caríssimo.


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